quarta-feira, 26 de junho de 2013

Pensamentos: Saúde

O Problema da Saúde no Brasil é de conceito. Os governos sociais-democratas lutam para prover a saúde comunitária enquanto o povo grita por mais saúde individual. A população busca atendimento como indivíduos e avalia a qualidade do serviços sob a perspectiva da experiência individual, enquanto o Estado busca a construção de comunidades saudáveis e sanitárias sob a perspectiva dos dados epidemiológicos regionais. Aí está a tensão. A luta está em se dar aquilo que não se quer a quem quer muito outra coisa. Mas saúde individual virou um mito, catedrais pseudoflexinerianas representantes do mundo estadunidense do consumo. Mas a população não dá a mínima para convicções ideológicas socialistas, ela quer é qualidade de vida, aqui e agora. O que a voz das ruas grita e os governos teimam em não entender é que a saúde pública importa na medida em que a qualidade de vida em saúde de cada cidadão conta. Sim, há uma crise de representação. Cabe saber se a população será convencida de que quer o que não deveria e deveria desejar mais daquilo que já obtêm, ou se os cidadãos em sua demanda prática mudarão a política pública de saúde ignorando as construções de uma imagem do sistema de saúde perfeito desenhadas pelos sanitaristas do passado.

quinta-feira, 20 de junho de 2013

Citação da Semana

"Um erro antigo é sempre mais popular que uma nova verdade" - Provérbio Alemão - Tradução Livre

“An old error is always more popular than a new truth” German proverb

terça-feira, 18 de junho de 2013

Experiências de como somos tratados #1 - Aeroporto

Na véspera da Copa das Confederações, eu fui buscar meu pai no Aeroporto Internacional de Confins (Tancredo Neves). Aquela era uma quinta-feira tranquila e o aeroporto aparentava estar mais vazio que de costume. O voo estava agendado para pousar às 7h58. Como um britânico, eu cheguei pontualmente ao aeroporto, faltando 5 minutos para as 8 horas. Foi o mais perto de ser preciso possível com um trânsito imprevisível e com as obras surpresa que a prefeitura e o governo do estado nos brindam. Pois bem, me aproximei da área de embarque e desembarque e permaneci dentro do veículo, pois ali as placas indicavam que era permitido parar, mas proibido estacionar. Não havia, ali, como nunca há no Brasil, informações claras sobre o tempo máximo de permanência para o embarque e desembarque. O que tornava tudo uma questão de interpretação. Sem avisos e partindo-se dos princípios que tudo que não é expressamente proibido é permitido em uma sociedade livre, um liberal poderia acreditar que, desde que o condutor não abandonasse o veículo, ele poderia permanecer ali o tempo que fosse necessário para realizar o seu embarque ou desembarque. Entretanto, para eu que venho morando no Brasil desde o meu nascimento, não é difícil compreender a nossa ambiguidade natural e intrínseca do "pode, mas não deveria". Logo, com tudo isso ponderado, considerei que 10 minutos seriam um tempo razoável de espera. Foi então que ao som de "A Voz do Brasil" pus-me a aguardar o desembarque de meu pai num dos extremos da enorme e semivazia plataforma.


Qual não foi a minha surpresa quando em menos de 5 minutos apareceu um homem da BHtrans que passou apitando intermitentemente como quem quer se fazer notar, mas sem nenhum significado dentre os códigos de sons que aprendemos na autoescola. Um pouco afastado de mim, alguns carros que decidiram parar em áreas proibidas se põem em movimento. É então que o representante do Estado passa por mim e me cumprimenta com um joinha. Eu retribuo educadamente o cumprimento. Mas consciente da nossa ambiguidade local eu ponho-me a observar o organizador de transito para tentar decodificar se seus ambíguos gestos significam uma aprovação da minha conduta por parar corretamente ou uma reprovação dela por não se adequar à sua interpretação sobre o tempo permitido de espera para o embarque e desembarque. Sem me dizer uma única palavra ele se afasta, mas à distância eu continuo assistindo aos seus movimentos.


Sem entender minha posição naquele contexto, eu estava me sentindo cada vez mais tenso, e, para piorar, os minutos demoravam a passar feito horas.


Aparentemente na interpretação do homem da BHtrans o tempo do embarque e desembarque era apenas aquele tempo mínimo da pessoa dentro do veículo ser defenestrada do carro para a plataforma como algo que se joga fora com asco ou um atleta em uma corrida de Triatlo ou o tempo do passageiro – que já deveria estar de prontidão na vaga em que o veículo iria parar, mesmo sem nenhuma numeração ou marcação – tropeçar desajeitado da plataforma para o veículo que o aguardava.


Foi então que ele retornou o caminho que tinha feito, passando próximo de mim. Eu descobriria em pouco tempo que ele caminhava mordido e incomodado pela minha falta de compreensão de que, ao ver um oficial do trânsito, o trafegante deveria obviamente deduzir que estaria fazendo algo errado e, assim, deveria procurar afastar-se rápido evitando ser enquadrado em algum delito. Afinal quem poderia atrevidamente se considerar um cidadão em pleno gozo de seus direitos e em conformidade com as restrições das leis e regulamentos se as nossas normas são tão extensas, confusas, intricadas e contraditórias?! Ninguém! Um real cidadão de bem deveria sempre deduzir que está em permanente descumprimento de pelo menos meia dúzia de regulamentos e evitar as autoridades. Autoridades que como pais zangados repreendem e enquadram os filhos só como o olhar. Olhar com o qual os filhos se endireitam e saem do caminho de suas vistas apavorados e colocando-se em seu devido lugar na hierarquia social.


Como a ambiguidade estava me deixando completamente desconfortável, não poderia perder a oportunidade de esclarecer tudo. Foi então que eu o surpreendi tomando a iniciativa e perguntando se estava tudo bem. Surpreso com a minha pergunta, irritado com a demora do atendimento à sua mensagem implícita no contexto e irônico por aquilo que lhe parecia óbvio ele me disse "Circulando meu amigo, aqui não pode ficar parado não, eu te disse".


Não havia dito nada! Apenas me cumprimentou e exigiu que eu lesse seus pensamentos e executasse suas ordens que estavam, apenas para ele, contextualmente implícitas. Ademais, não é exagero lembrar, não era o que a placa dizia, pois, segundo ela, ali não poderia estacionar, mas poderia parar.


Consciente de meu pleno status de cidadão eu respondi incomodado, mas também consciente de "como as coisas funcionam na prática em nosso Estado Policial" dei a resposta aceitável. Desculpei-me nem sei bem pelo que eu fiz de errado, expliquei o engano e prontamente saí dali.


Saí dali e dei voltas em torno do aeroporto, até decidir parar novamente no extremo oposto da plataforma. Tive de parar, precisava tentar entrar em contato com o meu pai e não iria ligar para ele dirigindo o carro – o que verdadeiramente vai contra as leis de trânsito. Como eu não tinha nenhuma informação sobre o voo, ou sobre a chegada dos passageiros, fiquei ali alguns minutos realizando sucessivas tentativas de contactar o meu pai. Isto tudo com a terrível sensação de poder ser repreendido pela desorganização geral do local e sua falta de conforto e de opções. A única alternativa, se é que tinha alguma, era o estacionamento que aparentava estar lotado, mesmo em um dia de baixo movimento, mostrando-se claramente subdimensionado. Além do mais me parecia absurda a ideia de estacionar para uma espera que, embora indeterminada, seria curta e pagar um alto valor por isto. Além disto, provavelmente o tempo de chegar ao estacionamento seria o tempo de meu pai alcançar a plataforma.


O pisca-alerta estava ligado me mostrando que aquela situação era um problema excepcional e que eu permaneceria ali o mínimo tempo necessário para solucionar a contingência e então sairia dali o mais rápido possível como alguém que se sente a abusar de um favor concedido.


É desnecessário dizer que a utilização do terminal aeroviário já estava paga nas caríssimas taxas de utilização do aeroporto. Elas foram pagas junto com a passagem e todos os pesadíssimos impostos que eu paguei e foram alocados para este péssimo e improvisado serviço.


Muito poucos minutos tinham se passado quando meu pai me ligou avisando que só estava pegando as malas e já sairia. Mas o alívio durou pouco, pois, como eu notaria durante a ligação, os apitos já soavam enquanto eu era enxotado da plataforma novamente.


Nem discuti. O apitador estava distante e esperá-lo se aproximar ou ir até ele só aumentaria a sua ira, como a maioria de nós sabe.


Circulei o aeroporto novamente e ainda na metade do percurso meu pai já estava me ligando novamente. Claramente, depois de pegar as malas, ele deve ter gasto menos de 2 minutos para alcançar a plataforma onde eu estava. Entretanto eu não pude atender à ligação, esta sim uma verdadeira infração de trânsito, pois estava em movimento. Terminei o circuito e parei novamente próximo ao centro da plataforma para responder à ligação com o coração na boca por estar parando na área permitida para fazer um embarque, mas na qual incomodava aqueles cuja função era organizar o trânsito como aquele que guarda um brinquedo na caixa para não estragar; ignorante que na sua paranoia conservacionista jogava fora qualquer utilidade no usufruto do brinquedo.


Respondi à ligação e meu pai me informou que já estava me aguardando no final da extensa plataforma. Era claro que eu já estava marcado naquele insultuoso jogo de esconde-esconde. Então eu decidi não ficar ali mais que os segundos necessários.


Parti imediatamente, e ainda bem, pois provavelmente já iria iniciar um apitaço.


Dirigi-me aonde meu pai me aguardava e assim que eu dei seta para parar e embarcar meu pai o apito começou e o guarda avançou em minha direção. Quando parei a coisa ficou tão absurda que o meu pai que não sabia de nada se incomodou e de longe sinalizou irritado que estava a embarcar.


Só então o apito cessou. Pude imaginar a cara de satisfação e gosto de dever cumprido do burocrata virtuoso que nos expulsou dali a despeito da afronta final. Mas a reflexão e indignação me acompanham até agora. Pensamentos sobre como somos maltratados apesar dos preços caros que pagamos e dos altos impostos que nos extorquem.


Não consigo parar de pensar como tudo isso está absurdamente errado e ninguém corrige a situação. Até quando aceitaremos ser tratados como cidadãos de segunda categoria e clientes dispensáveis?


Quando é que tomaremos alguma atitude sobre serviços públicos porcos e sofríveis e serviços de mercado caros e ruins?


Como aqui às vésperas da Copa das Confederações, eu estava em Kiev, na Ucrânia, às vésperas da Eurocopa. Lá eu vi uma situação muito diferente. Aquela ex-república soviética já estava há muito tempo plenamente convertida ao capitalismo quando eu ali estive. Lá, como aqui, se faziam as últimas obras para o acabamento daquela cidade para aquele grande evento. Entretanto lá, ao contrário daqui, o conforto era a regra. Campanhas na televisão reforçavam a importância da população ser receptiva. Os caminhos eram bem sinalizados e as regras estavam claras em qualquer lugar que se ia. Por exemplo, lojas sempre dispunham de horário de funcionamento mostrados nas portas e, se você fosse pontual chegando no horário de abertura, encontraria a loja aberta na hora exata anunciada. Havia em seu aeroporto espaço confortável para o embarque e desembarque não importando o tempo que levasse. As últimas obras haviam sido anunciadas com antecedência e estavam todas plenamente sinalizadas. Além disto, sempre havia rotas alternativas por onde o transito fluía sem nenhum transtorno.


Estas e mais um sem número de soluções simples, baratas e engenhosas proviam serviços públicos e privados de excelência e alta qualidade mesmo quando tudo em volta estava mudando. Lições de um local distante e pouco conhecido que deveríamos aprender.


sexta-feira, 7 de junho de 2013

domingo, 2 de junho de 2013

Nota sobre o Problema da Indústria

Nosso problema industrial não é de preço baixo demais (o qual se corrigiria via desvalorização do câmbio, o que tornaria os importados mais caros e os exportados mais baratos - dando maior folga para o aumento dos preços aqui dentro), pelo contrário, o preço de nossos produtos industriais é absurdamente alto. O nosso problema industrial é de custo alto e baixo diferencial competitivo (falta de inovação). Se voltássemos à ideia de Michael Porter nós veríamos que não conseguimos alcançar nenhuma de suas estratégias genéricas (liderança de custo, diferenciação ou Foco). Não temos liderança de custo porque nossos custos são altos demais, Carga Tributária extremamente alta, imposto especial que só incide na atividade industrial (IPI) - qualquer analogia aos impostos de desincentivo, como os dos cigarros é mera realidade - e muitas disfunções burocráticas nos trâmites legais que torna super caro fazer qualquer coisa, principalmente mudar em qualquer direção. Não temos diferenciação porque por aqui não há quase integração nenhuma em pesquisa e desenvolvimento e trabalho industrial prático. E não temos foco porque decidimos construir uma indústria plenamente diversificada. Estamos no que Porter relata como atolados no meio, e lá não há vantagem competitiva e sem vantagem competitiva nós estamos condenados a perder mercado até a falência. Está tudo lá, páginas 16 e 17 de Competitive Advantage de 1985 (1985!!! Eu não tinha nem nascido e ele já havia descrito o processo do desafio industrial brasileiro do século XXI).


Mas o que o governo tenta fazer? Se a indústria brasileira não consegue se reorganizar e adotar uma estratégia que a leve ao sucesso (muito por causa da interferência desorganizadora de governo, é verdade), é o povo (principalmente o mais pobre) que deve construir sua vantagem. Primeiro forçar um fechamento do país aos importados (principalmente através da manipulação dos preços relativos via câmbio), isso criará uma estratégia focalizada do setor industrial brasileiro no público brasileiro que simplesmente não terá outra opção de compra (algo em torno de oligopólios). Vai funcionar, para a indústria, enquanto o país fica mais pobre, as famílias perdem renda, e o PIB diminui, os industriais terão alguma recuperação. Mas é isso mesmo o que queremos?


O caminho mais adequado, na minha opinião, seria adotar a estratégia que fosse via setor competitivo. Os nossos problemas de custo estão na produtividade da mão-de-obra (educação, educação e educação), na baixa competitividade dos fornecedores (pouca inserção nas cadeias competitivas internacionais), carga tributária pesada demais (para que um imposto só sobre o processo de industrialização? é para desincentivar a indústria?) e burocracia totalmente desfuncional (gasta-se mais tempo no Brasil para calcular e pagar os impostos do que praticamente qualquer lugar do mundo, sem contar nas licenças e outros entraves regulatórios desnecessários e/ou desfuncionais aos quais nós chamamos de burocracia enquanto pedimos, paradoxalmente, por mais regulação). Já nossos problemas de inovação estão na nossa total incapacidade de integrar de forma eficaz ciência e prática. Por fim nosso problema de foco está num cenário instável (com flutuações caóticas de incentivos produzidos pelo governo a todo o momento com excesso de ativismo sem direção clara) e no fato do despreparo técnico do nosso empresariado nacional.